Renda x Preços: Desafio para a cadeia de abastecimento
Alguns estudos com números sobre consumo publicados nas últimas semanas trazem importantes informações para profissionais e empresas que trabalham diretamente ligados à cadeia de abastecimento de bens de consumo não duráveis.
Se, por um lado, há dados bastante positivos sobre o consumo e otimismo em relação aos resultados do setor mercearil até o fim de 2024, há também dados que pedem atenção e constituem verdadeiros desafios para a cadeia de abastecimento, desde o varejo até a indústria e seus distribuidores. Afinal, o cenário mostra um consumidor disposto a gastar um pouco mais, mas extremamente sensível a preços.
Mtrix Market Insights e os dados positivos do varejo em maio
No fim de junho, a Mtrix publicou seu estudo mensal com os resultados de maio nos mercados Alimentos e HCPC. Em ambos, foi constatado o bom desempenho do Varejo Alimentar, que no mercado Alimentos apresentou números positivos em quase todos os KPIs: +3,4% nas vendas em receita, +2,1% nas vendas em volume, +1,3% no preço médio e +3,8% no ticket médio por PDV.
Também no mercado HCPC o canal Varejo Alimentar foi o que exibiu mais bem resultados em âmbito nacional: +5,1% (vendas em receita), +6,2% (vendas em volume) e +6,0% no ticket médio por PDV.
No texto publicado, foi feita a avaliação de que, a despeito dos muitos indicadores positivos da economia brasileira, um cenário internacional turbulento e incertezas em relação às metas fiscais podem interferir no consumo. E isso tende a trazer inúmeros desafios para a cadeia de abastecimento.
Abras: consumo cresce 6,52% em maio
Ainda no fim do mês de junho, saíram dados do monitoramento mensal da Associação Brasileira de Supermercados – Abras deflacionados pelo IPCA, mostrando que o consumo nos lares brasileiros cresceu 6,52% em maio na comparação com abril. Ainda de acordo com o estudo, na comparação de maio de 2024 com maio de 2023, o crescimento foi de 2,16%, e de janeiro a maio deste ano o consumo apresentou alta de 2,25%.
Mesmo levando-se em conta as variações sazonais, o vice-presidente da ABRAS, Marcio Milan, pontuou que esse foi o melhor resultado para um mês de maio desde 2021, quando a elevação no consumo foi de +1,98%. Apesar dos desafios para a cadeia de abastecimento, o cenário parece promissor.
A avaliação é de que, entre abril e maio, a liberação de dinheiro do governo em diversas frentes contribuiu para o aumento na renda, que foi revertida em consumo: antecipação da primeira parcela do 13º salário para aposentados e pensionistas, pagamento do PIS/PASEP, a restituição do IRPF 2024 para 5,6 milhões de contribuintes e outros benefícios como bolsa família e vale gás.
Como vários desses pagamentos também têm parcelas pagas em junho (ainda não computadas no estudo), a perspectiva é de manutenção dos dados positivos no fechamento do semestre.
Atacado distribuidor cresceu 5,7% até maio, diz ABAD
Segundo os dados da pesquisa mensal Termômetro ABAD NielsenIQ, o crescimento do setor atacadista e distribuidor nacional foi de +5,7% no acumulado do ano até maio, em termos nominais. Em relação a maio de 2023 a evolução foi de +6,1%, enquanto na comparação com abril o crescimento atingiu +15%.
Apesar dos desafios para a cadeia de abastecimento, esses números robustos dão a perspectiva de resultados positivos para o setor no semestre e abrem a expectativa de crescimento semelhante até o fim do ano. Afinal, o segundo semestre costuma ser naturalmente mais aquecido.
A ABAD também avalia que o cenário macroeconômico com melhora na renda, queda no desemprego e perspectivas de crescimento do PIB deste ano elevada para 2,10%, segundo o último boletim Focus, irão contribuir para a manutenção do bom desempenho do setor.
Essa é também uma excelente notícia para a indústria, uma vez que o forte do setor é o abastecimento do pequeno e médio varejo alimentar, tão importante para o resultado dos fabricantes de produtos mercearis. De acordo com a NielsenIQ, o crescimento total do varejo em maio foi de +14,9%. Por canal, a evolução foi de +8,2% no Autosserviço, +22,8% no Cash&Carry, +14,3% no Farma e +8,9% no E-commerce.
Kantar aponta maior número de itens adquiridos
Na segunda semana de julho, a consultoria Kantar, especializada em dados do varejo, publicou seu estudo Consumer Insights Q1 2024, comparando a cesta de consumo entre março de 2023 e março de 2024. A pesquisa mostrou que, no período, houve um aumento de 7,8% nos itens adquiridos pelo consumidor a cada ida aos supermercados.
O estudo indicou crescimento de 9,9% na cesta Bazar, 9,4% na cesta Bebidas e 9,3% na cesta Doces. Foi também registrado aumento nas cestas Salgado (7,7%) e Higiene e Beleza (5,3%). Assim como ocorre com a Abras, a avaliação da Kantar é de que o maior volume de repasses do governo para a população de menor renda impulsionou esse crescimento e vem permitindo a inclusão no carrinho de compras de alguns produtos voltados à autoindulgência. Ou seja, isso traz uma perspectiva interessante às empresas que já estão fazendo o planejamento para 2025 a fim de enfrentar os desafios para a cadeia de abastecimento e maximizar sua rentabilidade.
Por outro lado, contudo, nas camadas de menor renda permanece a necessidade de escolher com cuidado o que levar para casa, já que ao lado de promoções e ofertas de produtos mais supérfluos há uma sensível elevação de alguns itens básicos.
Preços em alta preocupam o consumidor
Estratos sociais com menor poder aquisitivo, dependentes de programas de redistribuição de renda e altamente vulneráveis às oscilações de preços, formam um contingente de grande potencial de consumo. Um contingente que se anima a comprar produtos fora da cesta básica sempre que o orçamento permite.
Contudo, embora qualquer elevação de renda abra espaço para a experimentação de novos produtos, quando o bolso é pressionado a tendência desse consumidor será sempre restringir a aquisição de salgadinhos e chocolates em prol do arroz com feijão de todo dia.
Esse cenário é corroborado pela última pesquisa de sentimento do consumidor no Brasil disponibilizada pela McKinsey, com dados de fevereiro deste ano. Segundo o estudo, as maiores preocupações dos brasileiros das classes C2/D/E são o desemprego e a capacidade de pagar contas.
Além disso, um a cada três brasileiros afirmaram comprar produtos mais baratos que o habitual, fazendo o trade down (opção por marcas mais baratas) subir 7 pontos percentuais em relação ao ano anterior. Os dados do estudo mostraram que cerca de 40% dos brasileiros compraram itens em tamanho e/ou quantidade menor e que 37% mudaram de varejista atrás de preços melhores. Dessa forma, o setor varejista precisa estar preparado para os desafios para a cadeia de abastecimento que envolvem volatilidade de produtos, preços e comportamento de compras.
O aparente paradoxo entre a melhora nos dados macroeconômicos e as preocupações do consumidor se explica pelo fato de que apesar de o índice de inflação se manter dentro da meta, componentes desse índice que afetam de forma desigual o consumidor de baixa renda se mantêm em alta. Caso dos produtos in natura e do gás de cozinha, por exemplo. Dessa forma, a venda de produtos industrializados se encontra mais do que nunca na encruzilhada entre o desafio e a oportunidade.
Desafios para a cadeia de abastecimento: dados mitigam incertezas
Onde estão os consumidores com renda disponível para essas compras que vão além do básico? Quais os pontos de venda mais promissores e em quais é preciso investir em promoções? Que ações a indústria pode desenvolver com seus distribuidores para garantir o melhor retorno? Como os atacadistas e distribuidores podem apoiar o varejo em iniciativas capazes de cativar o consumidor final? Como definir a melhor política de preços?
Todas essas perguntas são cruciais e só podem ser respondidas por meio de ferramentas de inteligência de mercado capazes de coletar dados com alto grau de consistência, identificar, mensurar e analisar os números de sell-in e sell-out, fazer o cruzamento de informações estratégicas e gerar insights precisos e bem fundamentados para a tomada de decisões rápidas e assertivas. Seja para ações corretivas, seja para aproveitar janelas de oportunidade de negócios.
O mais importante, porém, é lembrar que essas ferramentas, embora poderosas e ágeis, para produzir os melhores resultados e tornar-se um verdadeiro diferencial competitivo precisam estar perfeitamente incorporadas à rotina da empresa. Alimentar o sistema com os dados corretos, treinar pessoal, fazer ajustes e customizações de acordo com o perfil da empresa são etapas que demandam atenção, tempo e planejamento.
Assim, nunca é cedo demais para se implementar uma plataforma de business intelligence, uma vez que a melhor forma de solucionar questões ligadas a segmentação de mercado e desempenho de equipes de vendas e trade é antecipar-se a elas. O setor varejista costuma lidar com questões de precificação e estoque, o que gera grandes desafios para a cadeia de abastecimento, mas estar atento aos movimentos do seu setor e ter ferramentas calibradas para as reais necessidades do seus negócios certamente fazem toda diferença!